domingo, 19 de abril de 2009

Ocidente e Islã: os medos recíprocos. Entrevista com Gilles Kepel

"Se nos esquecemos das teorias de Huntington, tudo se torna mais simples". Os europeus podem desempenhar um papel importante: na França, os jovens muçulmanos já são a vanguarda de uma nova geração híbrida e mestiça. "O discurso feito em Ankara por Barack Obama é um ótimo sinal que encerra a época do choque de civilizações teorizado por Samuel Huntington". Gilles Kepel, um dos maiores especialistas sobre o mundo muçulmano, está convencido disso. A reportagem é do jornal La Repubblica, 14-04-2009.
A tradução é de Moisés Sbardelotto. "Com esse discurso, como também com a decisão de fechar Guantánamo, o presidente norte-americano quer romper radicalmente com a era Bush e a sua ideologia. A América de Obama quer se posicionar além da dupla terror-martírio. Ele não acredita mais na grande cruzada da época Bush para transformar o mundo muçulmano com a força. E, abandonando essa visão do mundo, Obama tenta marginalizar a Al Qaeda, cujo mito prospera graças à oposição à política de Bush". Eis a entrevista.
A teoria do choque de civilizações é útil aos fundamentalistas islâmicos? Certamente, os islâmicos adoram o livro de Huntington, porque dá a eles um estatuto e legitima a sua ação. Graças a isso, eles se tornaram os únicos representantes das populações muçulmanas. Depois do fim do comunismo, Huntington procurou encontrar novas linhas de ruptura a partir de uma oposição entre civilização e religião. Mas desse modo reificou identidades que, na realidade, são móveis. Se ele teve tanto sucesso, é só porque a sua teoria chegou em um momento de vazio ideológico.
Então, a sua parábola se concluiu? Obama, em todo o caso, não a compartilha absolutamente. O choque entre Bush e Bin Laden nascia do choque entre duas grandes narrações: a da guerra contra o terror, feitas pelos norte-americanos, e a da jihad contra o Ocidente. Duas narrações que faliram em seus objetivos. Bush não conseguiu transformar o Oriente Médio em uma província submetida aos Estados Unidos, enquanto Bin Laden não conseguiu mobilizar as massas muçulmanas atrás da bandeira do martírio. Então, Obama quer fechar o parêntese aberto pelos atentados do 11 de setembro de 2001. Veremos se, depois de ter encerrado a era Bush, a sua política será suficientemente eficaz para encerrar também a era Bin Laden. E sobretudo reconstruir as relações com o mundo muçulmano.
Acredita que ele conseguirá? Em todo o caso, não poderá fazer isso sozinho, dado que a América não tem mais os meios para uma política unilateral. Ele precisa cooperar com os aliados e deve levar em conta as exigências dos outros países. Obama sabe que o mundo se tornou multipolar e está procurando se adaptar a essa realidade, sem ideologias pré-concebidas. Nessa perspectiva, a Europa pode desempenhar um papel importante, por exemplo, construindo um espaço comum no qual possam se reencontrar todos os países que estão na orla do Mediterrâneo. Esse espaço pode se tornar uma oportunidade de encontro entre o Ocidente e o Islã, para superar os medos recíprocos deixados de herança por aqueles que, nos dois campos, invocavam a cruzada e a jihad. Se, porém, esquecermos as teorias de Huntington, tudo se torna mais simples. Certamente, a presença dos muçulmanos na Europa foi vivida de maneira dramática no momento dos atentados de Madri ou de Londres. Mas a situação está mudando. Na França, os jovens muçulmanos, na realidade, são já a vanguarda de uma nova geração híbrida e mestiça, que vem do mundo muçulmano, mas é sempre mais de cultura europeia. Apesar de todas as dificuldades, essa nova geração já está deixando para trás a guerra e as culturas.

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