segunda-feira, 19 de outubro de 2009

O MUNDO EM 140 CARACTERES !

Dois anos atrás, o americano Christopher Isaac Stone, mais conhecido pelo apelido de infância Biz Stone, de 35 anos, criou o Twitter em parceria com os amigos Jack Dorsey e Evan Williams. O Twitter, que permite a publicação, em tempo real, de mensagens curtas, de apenas 140 caracteres, tornou-se um fenômeno da internet, com 50 milhões de pessoas cadastradas. O modelo, inspirado nas mensagens de texto de telefone celular, inaugurou uma forma arrebatadora de comunicação via internet. Autor de dois livros sobre as origens e o significado social dos blogs, Stone está entre as 100 personalidades mais influentes do mundo, segundo a revista americana Time. Ex-funcionário do Google, ele participou do desenvolvimento de outro serviço de mídia social de grande repercussão, o Blogger. Stone chega ao Brasil nesta terça-feira, para participar do Encontro Agenda do Futuro, do Grupo TV1, em São Paulo. A entrevista é de Paula Neiva e publicada pela revista Veja, 21-10-2009. Eis a entrevista.
Apenas dois anos depois da fundação do Twitter, a revista Time incluiu seu nome na lista das 100 pessoas mais influentes do mundo. Não é cedo demais para virar celebridade?
O caminho está só no começo. Por isso, ainda é cedo para ter plena consciência do que está ocorrendo. A escolha da revista Time foi um prêmio pela dedicação do nosso time, que realmente criou algo especial."Muitas pessoas buscam na internet informações sobre seu microcosmo. Elas querem saber por que está faltando luz ou a razão do barulho na vizinhança e esperam que alguém saiba e coloque na rede"
O que desperta maior interesse no Twitter? Fofocas ou notícias?
Nem um nem outro. O que desperta maior interesse são os assuntos relacionados à comunidade em que o usuário está inserido. Observamos que muita gente busca informações sobre seu microcosmo. Ou seja, se falta luz no bairro ou se há um barulho incomum, as pessoas buscam informações no Twitter, sabendo que seus vizinhos estão na mesma situação. É natural esperar que alguém saiba o que está ocorrendo e coloque isso na internet. Nossa ferramenta se tornou uma maneira de alguém se conectar imediatamente com pessoas que estão passando ou que passaram por uma mesma situação. Existe um senso de comunidade, com as pessoas interligadas e sabendo que vão encontrar informações atualizadas sobre interesses em comum. Dessa forma, o que mais movimenta o Twitter não é um tipo de post ou um post específico, mas o conjunto de muitos posts sobre uma enormidade de temas.
Algumas empresas impedem o uso do Twitter por seus funcionários. Não deveria ser o contrário?
É compreensível que as empresas queiram preservar informações internas, confidenciais e que pensem em restringir sua divulgação. Por outro lado, nem sempre uma indiscrição é negativa para a empresa. A repercussão dessas informações pode causar grande benefício, ao aumentar o interesse do público. Pelo menos nos Estados Unidos, esse é um fenômeno que já ocorreu com muitos programas de televisão. Várias empresas usam esse recurso como marketing. Mas ainda é preciso testar possibilidades para estabelecer os limites dessa ferramenta.
Barack Obama abusou do Twitter para mobilizar os eleitores e arrecadar fundos na campanha. Isso não torna as eleições mais superficiais?
A internet foi criada para dar a todos a possibilidade de obter e publicar informações. Essa troca livre e desimpedida é muito poderosa. O problema era a barreira técnica. Muita gente deixa de publicar na internet por desconhecer a linguagem técnica do meio. O Twitter reduziu essa barreira. O único requisito para publicar é saber digitar. Os políticos precisam estar conectados com seus eleitores. Como o Twitter permite a conexão direta, é natural que tenha se tornado uma ferramenta presente nas campanhas políticas. Não há nada de errado nisso. Quanto mais pessoas compartilharem informações, melhor para todos.
A revolta popular contra a fraude eleitoral no Irã foi chamada de "Revolução do Twitter". Surgiu um novo inimigo das ditaduras?
Acredito que a troca e a circulação de informações podem ter, sim, um impacto positivo em escala global. A troca aberta de informações é algo desejado há muito tempo. O que criamos, no fundo, foi uma daquelas raras coisas de que não sabemos que precisamos, até o momento que passamos a usá-las.
As pessoas agora medem seu sucesso pessoal de acordo com o número de seguidores que arrebanham no Twitter. Isso é sadio?
Elas certamente estão oferecendo informações relevantes a outras pessoas. A forma mais eficiente de ter muitos seguidores é "tuitar" informações úteis e de interesse para o maior número de pessoas que compartilham determinado perfil. Nem sempre é preciso ser algo inédito. Pode ser uma citação ou um endereço da web interessante. É natural que as pessoas queiram ter um número cada vez maior de seguidores. Muitas usam o cartão de visita e a assinatura de e-mail para propagandear que já estão no Twitter.
Alguma estratégia de aumentar o número de seguidores no Twitter já o surpreendeu?
A primeira que me vem à cabeça é a foto que o ator Ashton Kutcher publicou da própria mulher, a atriz Demi Moore, de calcinha. Até gostaria de saber se ele teve problemas em casa por causa disso. Foi um sucesso instantâneo.
Que mensagem mais o comoveu?
No ano passado, um estudante da Universidade da Califórnia em Berkeley, James Buck, descobriu que jovens no Egito organizavam protestos usando seus contatos no Twitter. Ele viajou para o Egito para acompanhar uma manifestação e foi preso. Como os policiais não confiscaram seu celular, ele conseguiu "tuitar" uma única palavra: "Preso". Os amigos que sabiam onde ele estava contataram a embaixada americana. Pouco tempo depois, ele publicou: "Libertado". O episódio me abriu os olhos para um uso do serviço que eu não imaginava.
O Twitter é a quarta entre as redes sociais mais acessadas no Brasil, com 10 milhões de visitantes por mês. O sucesso no Brasil o surpreendeu?
Há apenas dois anos nem sequer tínhamos certeza de que alguém gostaria da nossa ideia. Mas não posso dizer que o sucesso no Brasil tenha sido uma surpresa total, porque já sabia da popularidade das redes sociais no país. Parece que a vontade de se conectar com outras pessoas é algo intrínseco à cultura do brasileiro.
Qual a principal diferença entre o Twitter e outras redes sociais, como o Orkut e o Facebook?
Nas redes sociais, a pessoa é obrigada a seguir quem o segue. Ou seja, para ter acesso às informações de alguém, é preciso que essa pessoa também esteja na sua rede de contatos. No Twitter, não. Não há necessidade de reciprocidade para seguir alguém. Você pode não seguir ninguém e ter milhares e até milhões de seguidores.
Como ocorreu com outros sucessos digitais, o destino do Twitter é ser vendido logo?
Não temos nenhum interesse em falar sobre vender a ferramenta. Estamos construindo uma companhia que é nossa e que ainda estará viva por muito tempo. Sem publicidade, qual será o modelo de negócio dessa rede que vocês criaram? Somos uma empresa muito jovem. Temos outras prioridades. Precisamos nos concentrar em expandir o serviço e ter a certeza de que o Twitter se tornará uma ferramenta indispensável na vida das pessoas. Estamos abrindo portas, mas a exploração comercial não é nossa maior preocupação no momento.
Os investidores que deram dinheiro a vocês não pressionam para chegar a algum modelo que dê lucro?
Queremos inventar uma fórmula que não aborreça o usuário. Estamos trabalhando na criação de ferramentas desenvolvidas para empresas. Até o fim do ano, vamos ter contas específicas para empresas. O serviço terá uma fase inicial experimental. É daí que poderá vir o retorno para quem investiu em nossa ferramenta.
A ideia de cobrar não pode assustar os usuários não comerciais?
Não. O Twitter continuará sendo gratuito para todos. Mas a empresa que quiser poderá ter acesso a ferramentas adicionais, que mostrem se uma mensagem específica fez sucesso ou não, que permitam análises ou a ajudem a ser mais atraente para o público que deseja alcançar. Além disso, haverá uma espécie de certificação de que aquele Twitter realmente pertence àquela empresa.
Mantido o atual ritmo de crescimento, o que se pode prever sobre o futuro imediato das redes sociais? O mundo terá mais mobilidade devido ao acesso móvel à internet. Hoje, 4 bilhões de pessoas têm celular, mas apenas 1,5 bilhão dispõem de acesso à internet. Daqui a alguns anos, qualquer pessoa, independentemente da idade e do local onde viva, participará de redes sociais e usará ferramentas como o Twitter. Acho que haverá uma integração entre as redes sociais, em decorrência não apenas da evolução da tecnologia, mas da vontade das pessoas.
O que não aparece de modo algum em seu Twitter?
Qualquer coisa que desagrade a minha mulher. Não quero ficar em apuros em casa. Não que eu esteja sempre ligado nisso. O que quero dizer é que, de maneira geral, deixo de fora informações de cunho pessoal, que possam fazer com que eu me arrependa mais tarde. Como o Twitter é rápido e fácil de usar, muita gente acaba revelando nele justamente coisas das quais se arrepende depois... Eu mesmo já passei vergonha uma vez, um ano atrás. Temos um sistema que permite enviar mensagens sigilosas a um destinatário específico. Escrevi a minha mulher informando a hora de chegada do trem em que eu viajava e pedindo que me encontrasse na estação. A mensagem terminava com um "eu te amo". Fiz algo errado e mandei essa mensagem a todos os meus seguidores. Quando percebi o engano, já tinha recebido comentários com brincadeiras ou dizendo que me amavam também, mas que não ia dar para me buscarem na estação de trem. Muita gente expõe de forma excessiva sua intimidade na internet... As pessoas estão aprendendo que, quando fazem um blog e publicam coisas na rede, não são apenas os amigos que veem e participam de sua vida. Muitas ficam chocadas quando se dão conta de que estão realmente expondo sua vida em um ambiente público. Creio que aos poucos elas vão aprender a selecionar o que realmente querem compartilhar com os outros. Vi que Biz Stone segue 288 pessoas pelo Twitter. Dá tempo de ler tudo o que elas publicam? Não vejo problema em seguir muitas pessoas, porque as atualizações são mensagens curtas. Checo minha conta muitas vezes ao dia, mesmo quando estou no supermercado ou no táxi. Quero estar sempre por dentro do que está acontecendo.
Mas são 288 pessoas mandando mensagens o tempo inteiro. Alguma coisa escapa, certo?
Sinceramente, acho que deixo de ler algumas coisas. Mas tudo bem. Essa é a beleza do Twitter. Como as atualizações são curtas e simples, não é preciso preocupar-se com a perda de algumas delas. Outra coisa de que gosto é que, ao contrário do e-mail e das mensagens instantâneas, no Twitter não há necessidade de resposta. Você responde se quiser, e quem publica não tem a expectativa de resposta. Se você ficar longe do Twitter por alguns dias, ninguém vai se zangar com você por isso. Cada dia que passa, eu recebo mais e mais e-mails em minha caixa postal. O e-mail é um sistema impraticável, pois é simplesmente impossível responder a toda a demanda que cria. O Twitter permite fugir dessa obrigação.

Honduras: O papel dos EUA é decisivo. Entrevista especial com Manuel Torres Calderón

Manuel Torres Calderón é jornalista do jornal de opinião El Inventario. Vivendo em Honduras, Calderón nos relata a situação atual a partir do conflito que vive o país. Ele também fala sobre a presença de Zelaya na Embaixada brasileira e do papel que Obama pode ter nesse contexto. “Este é um conflito em uma área de influência geopolítica dominante dos Estados Unidos. Seu papel é decisivo, e se o golpe não for revertido é porque não tentaram a fundo”, apontou Calderón, que acha importante diferenciar os princípios de Obama para a política exterior dos EUA do que chama de “velhos” princípios “de outros poderes em Washington”.Calderón acredita que seja provável que, com esta situação colocada pelo golpismo, milhares de hondurenhos migrem para o “norte” do continente, pois, o “impacto é forte na área econômica e social, permitindo antecipar que a repressão política trará a repressão econômica”, afirmou.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Como cidadão, como você se sente em relação à situação em Honduras?
Manuel Torres Calderón – É uma mistura de sentimentos. De um lado, a rebeldia mostrada por amplos setores da sociedade civil dá esperanças de mudança, de resistência e luta frente ao autoritarismo e às injustiças, mas, ao mesmo tempo, o comportamento repressivo dos grupos políticos, empresariais e militares de poder, sua cegueira ante as demandas de equidade e justiça confirmam que é possível reverter o golpe de Estado a curto ou médio prazo, mas reverter o “golpismo” – cuja essência é o modelo neoliberal – custará muitos sacrifícios mais.
IHU On-Line – Há uma pressão internacional sobre Micheletti. Que influencias esta pressão pode ter sobre o resultado deste conflito?
Manuel Torres Calderón – Acredito que a principal conquista é ter limitado a repressão do Golpe. A repressão existe, mas, de alguma maneira, é monitorada. Assim, a gestão da comunidade internacional intimida os golpistas para que não cometam maiores violações aos direitos humanos.
IHU On-Line – Micheletti pode vir a invadir a Embaixada do Brasil? Como o povo reagirá, caso isso aconteça?
Manuel Torres Calderón – Não duvido que houve intenções do governo atual de entrar na Embaixada, mas, rapidamente, deram-se conta de que seria um erro que lhes custaria muito caro. Em todo caso, a agressão à Embaixada e aos seus moradores existe uma vez que há o cerco policial que empregou medidas muito repressivas, como a arma sônica que experimentaram.
IHU On-Line – A intervenção dos Estados Unidos é necessária?
Manuel Torres Calderón – Este é um conflito em uma área de influência geopolítica dominante dos Estados Unidos. Seu papel é decisivo, e se o golpe não for revertido é porque não tentaram a fundo. É necessário distinguir, possivelmente, entre os “novos” princípios que Obama tem exposto para sua política exterior e os “velhos” princípios – claramente vigentes – de outros poderes em Washington.
IHU On-Line – E qual é sua opinião para o que chamam de “silêncio de Obama”?
Manuel Torres Calderón – Creio, dando seguimento à resposta anterior, que Obama não percebe que o conflito hondurenho é uma prova imposta pela América Latina, e não pelos “chavistas”, como quer fazer acreditar a direita, assim como os poderes mais conservadores do continente. Se o golpe hondurenho triunfa, trará maior instabilidade à região, começando pela área da América Central.
IHU On-Line – Como Honduras está sentindo o impacto do isolamento?
Manuel Torres Calderón – O impacto é forte na área econômica e social, permitindo antecipar que a repressão política trará a repressão econômica. O eventual êxodo de milhares de hondurenhos para o “norte” é uma circunstância muito provável. Assim ocorreu em 1999 após o impacto do furacão Mitch e o fracasso de converter aquela tragédia em uma oportunidade para a transformação nacional.

domingo, 11 de outubro de 2009

''Mundo era mais seguro na Guerra Fria'', constata Mikhail Gorbachev

Esta imagem acima, correu o mundo em 1991, ano do fim da URSS, quando Gorbachev duelava com Boris Yeltsin:
Ele já se aproxima de seus 80 anos e fala de forma pausada e grave. Está com vários quilos a mais do que mostravam as fotos de seus dias de glória. No entanto, alguns traços denunciam a figura que revolucionou a história. Em 1985, aos 54 anos de idade, Mikhail Gorbachev foi eleito secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética em 1985. Nos anos seguintes, tentou uma aproximação com os EUA e adotou uma política que foi resumida por duas palavras: glasnost ("transparência") e perestroika ("reestruturação"). A reportagem e a entrevista é de Jamil Chade e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 11-10-2009. Agora, 20 anos após a queda do Muro de Berlim, o russo lamenta. "O mundo perdeu a grande oportunidade de se desmilitarizar e acabar com as armas nucleares", disse Gorbachev na semana passada, em entrevista a um grupo restrito de jornalistas internacionais, entre eles o Estado. Em suas declarações, ele admite que o plano do presidente americano, Barack Obama, de ter um mundo sem armas nucleares enfrentará "muitos obstáculos". Eis a entrevista.
Após 20 anos da queda do Muro de Berlim, a Europa está unida. Qual sua avaliação sobre o que foi atingido? O muro não dividia apenas a Alemanha. Ele era um fosso entre dois mundos. Com sua queda, foi aberto o caminho para se construir uma nova Europa. E foi isso o que ocorreu. Mas a solução para uma questão crítica não foi obtida. Não conseguimos tornar o mundo mais seguro. Perdemos uma enorme oportunidade histórica. O Ocidente insiste em dizer que a queda do Muro de Berlim simbolizou a vitória de um dos lados na Guerra Fria. Hoje, contudo, eu me pergunto que vitória foi essa.
Por quê? Existe uma ameaça real de corrida armamentista no mundo que o fim da Guerra Fria não solucionou. Hoje, vemos que os gastos com a militarização de Estados ganharam o lugar de gastos que teriam de ir para o setor social. Nos anos 80, certamente, tivemos um momento de tensão entre as potências. No entanto, em 1985, eu e (o então presidente americano) Ronald Reagan optamos por declarar que uma guerra nuclear simplesmente não seria vencida por ninguém. Portanto, sequer deveria ser lutada. Vinte anos após o fim da Guerra Fria, ainda temos milhares de armas atômicas e até mesmo novas potências nucleares.
Então o sr. acha que o mundo hoje não é mais seguro do que durante a Guerra Fria? Hoje não temos um mundo mais seguro e o maior perigo é, sem dúvida, a proliferação das armas nucleares. Há o risco de que essa proliferação ocorra para atores fora do controle dos Estados, como organizações terroristas. No total, podemos dizer que existem hoje 40 países com potencial nuclear.
O presidente americano, Barack Obama, propõe um esforço conjunto para eliminar as armas nucleares do mundo, projeto que teve apoio no Conselho de Segurança da ONU. Qual a sua avaliação? Ninguém quer a existência de armas nucleares. Mas os obstáculos para se atingir essa meta proposta pelo presidente Obama são enormes e não se trata apenas de limitar a produção na Coreia do Norte e no Irã. O maior problema é que, enquanto as cinco potências que reconhecidamente têm armas nucleares (EUA, Rússia, China, França e Grã-Bretanha) não aceitarem uma redução real de seus arsenais atômicos, os demais países não terão qualquer incentivo para se desfazer de seus próprios programas. Se os grandes países reduzirem seus arsenais, as demais nações não terão como esconder. Mas existe ainda um outro problema. Se essa redução não for acompanhada por um sentimento de segurança para todos, ela jamais funcionará.
E quanto às armas convencionais? Elas também terão de entrar no pacote de redução. Se não ocorrer uma desmilitarização da política internacional, então a ideia de um mundo livre de armas nucleares não faz sentido. Nenhum país aceitará desistir de seu programa e permitir uma superioridade total dos EUA.
Qual é a solução então? Os participantes de uma negociação nesse sentido não podem ter a percepção de que sua segurança foi enfraquecida. Por isso, o acordo não poderá ser apenas sobre armas nucleares. Tem de ser bem mais abrangente. Além disso, o acordo terá de ser essencialmente multilateral. Há sinais importantes de que americanos e russos voltaram a negociar. Obama reviu seus planos militares e está dando maior abertura para debater esses assuntos. Um entendimento final, contudo, terá de vir da ONU.

sábado, 3 de outubro de 2009

“Se o governo tivesse coragem política, ele reestatizaria 100% da Petrobras”. Entrevista especial com Ildo Sauer

“O petróleo continua exercendo um papel essencial para que esta forma de produzir permaneça. Este é o problema maior. Não podemos vincular o problema a uma fonte natural, o problema está na sociedade, na sua organização para a produção”. É isso que aponta o engenheiro nuclear e ex-diretor da Petrobras, Ildo Sauer. Em entrevista à IHU On-Line, realizada por telefone, Sauer crítica o governo, principalmente, no que diz respeito à condução das questões que envolvem a exploração e os recursos do petróleo que está sob a camada do pré-sal. Ele analisa, nesta conversa, a exploração do petróleo em relação à crise ecológica, modelos de exploração, a criação da Petrosal, e responde também a relação que tudo isso tem com as próximas eleições presidenciais. Para Ildo, “estamos sacrificando a chance de administrar o país a longo prazo em nome da disputa imediata pelo poder para reproduzir esse sistema”. Nem o modelo de partilha nem o de concessão. Ildo Sauer defende e indica que os movimentos sociais também apoiam essa ideia, que o petróleo deve ser 100% reestatizado, e, desta forma, o país deve recomprar as ações da Petrobras, e, com isso, a empresa passa a operar o petróleo “porque tem a melhor tecnologia do mundo para o pré-sal”.Ildo Sauer de 2003 a 2007, foi Diretor Executivo da Área de Negócios de Gás e Energia da Petrobras. Desde 1991, é professor na Universidade de São Paulo. Engenheiro Civil pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Sauer é mestre em Engenharia Nuclear e Planejamento Energético pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e doutor em Engenharia Nuclear pela Massachusetts Institute Of Technology. Recebeu pela USP o título de Livre Docência em 2004.Confira a entrevista.
IHU On-Line – Como você analisa a exploração do petróleo na camada pré-sal em relação à crise ecológica?
Ildo Sauer – Há uma polêmica em torno do uso do petróleo em relação às emissões de gás do efeito estufa. É uma questão real, mas tem que ser entendida na sua totalidade. O vínculo maior da questão da poluição não é o vínculo natural físico, mas o vínculo social. Significa, historicamente, como a humanidade, na sua organização social, tem construído a capacidade de produzir bens e serviços e promover a circulação de bens, serviços e pessoas para manter o sistema econômico hegemônico funcionando na sua lógica intrínseca. Assim, o modo capitalista de produção, que hoje é hegemônico no mundo inteiro, tem promovido uma espécie de necessidade permanente de induzir o aumento do consumo para permitir o aumento da produção e, assim, gerar excedentes econômicos que permitem a acumulação e, ao mesmo, um aumento dos significados diretos disso. Em linguagem popular: é o aumento dos lucros dos que controlam a produção. Neste sentido, ao longo dos últimos séculos, a partir da revolução industrial e, em sua segunda fase, no fim do século retrasado, temos tido uma intensificação extraordinária do consumo da produção e da circulação. Na primeira etapa da revolução industrial, principalmente, o efeito era vinculado ao uso do carvão, quando começou o incremento do gás do efeito estufa, especialmente o CO2, além de outros na atmosfera. A partir da segunda fase da revolução, quando o petróleo começa a ser extraído, em 1859, para fins industriais, ele passa a ter um papel predominante. Só que, na atual estrutura produtiva com quase sete bilhões de habitantes no planeta, com cerca de 200 milhões de habitantes no Brasil, o sistema hegemônico permite que essas pessoas sobrevivam, ainda que grande parte delas de maneira assimétrica, já que há uma concentração de acesso aos bens, serviços e amenidades em favor de grupos pequenos. E a grande maioria vive em condições precárias no mundo inteiro e também no Brasil.
O petróleo é essencial
O fato é que esta é a condição concreta de vida. O petróleo continua exercendo um papel essencial para que esta forma de produzir permaneça. Este é o problema maior. Não podemos vincular o problema a uma fonte natural, o problema está na sociedade, na sua organização para a produção. Fontes de energia naturais existem em grande quantidade, capazes de suprir, mesmo fisicamente, as necessidades equivalentes à do petróleo, do carvão e de outras fontes hoje utilizadas. Elas não são utilizadas porque o sistema de produção hegemônico não as escolhe, pois permitiriam menos lucros, menos excedente econômico. E, ao mesmo tempo, de outro lado exigiriam mais trabalho das pessoas, mais capital, que é também trabalho acumulado, para permitir que a mesma produção acontecesse. Este é o dilema. O problema não está na fonte, na natureza, mas na sociedade, mesmo na constituição ambiental. A demanda total de petróleo não é determinada a partir de um país, mas a partir da forma como a organização mundial da produção se dá hoje e como se dá a sua circulação, junto com a circulação de pessoas em escala global.
Então, se o petróleo não vier do pré-sal, vem direto de outra região do mundo. Tem duas razões para a existência da transição energética para fontes. A primeira é a própria exaustão definitiva do petróleo. O petróleo é a forma mais concentrada, eficaz, maleável e flexível de energia e, por isso, tornou-se tão importante na estrutura de produção e na estrutura urbana de organização da vida social como instrumento que permite a produção e a circulação. A sua substituição, hoje, por fontes renováveis, vai demandar mais esforço, mais trabalho, por tanto mais custo e menos excedente econômico. Este é um dos problemas. O segundo problema, de qualquer maneira, vai ter que ser enfrentado, porque os recursos de petróleo convencionais estão se exaurindo em razão da taxa atual de consumo, que supera os 84 milhões de barris de petróleo por dia. O que significa que os dois trilhões de barris remanescentes de recursos conhecidos de petróleo convencionais estarão se exaurindo de qualquer maneira nas próximas três ou quatro décadas, dado que o consumo e a produção ainda estão aumentando. O segundo problema, evidentemente, é que há uma preocupação com a questão da mudança climática com a matriz carbonizada da economia mundial, e as tentativas se desencaminham para a busca de novas fontes de energia que permitam substituir o petróleo em função de sua exaustão e, também, visando às reduções de gás do efeito estufa. Este problema vai exigir muito investimento em ciência e tecnologia para sabermos os impactos que esta substituição vai ter também na estrutura de produção. A crise financeira e o petróleoTemos que alterar a lógica, hoje, hegemônica de que o consumo tem que ser intensificado. Brasil e Estados Unidos, nesta crise que se iniciou a pouco mais de um ano, têm intensificado e incentivado a produção de automóveis com remoção de impostos, criando um caos duplo. Primeiro, intensificando a produção de engarrafamentos nas grandes cidades como São Paulo. Houve incentivos fiscais, renúncia do governo de ter dinheiro para investir em outras prioridades para acelerar a produção de automóveis, que estão provocando o caos e aumentando a poluição em escala global. Isto é um exemplo concreto de como os governos estão muito mais motivados por continuar aumentando a produção e o consumo dentro da lógica capitalista do que buscar as soluções para os problemas ambientais e sociais da humanidade. O petróleo, querendo ou não, gostando ou não dele, vai estar presente, e não é uma questão de um país ou outro escolher. Não vejo, hoje, no horizonte, mecanismos globais de regulação e controle sobre o sistema econômico capaz de enfrentar esta questão fundamental com eficácia.
IHU On-Line – Quais são as principais mudanças entre o modelo que existia em 2002 e o que está hoje em vigor?
Ildo Sauer – O de 2002 é o mesmo que está em vigor hoje. Porque, no governo Lula, embora na campanha houvesse uma discussão da proposta para mudar do regime de concessão para o regime de partilha, isso não aconteceu. Faltou coragem política de enfrentar o interesse das petroleiras internacionais e privadas brasileiras de mudar o regime. O regime anterior foi baseado na mesma ideia que levou a hegemonia da onda neoliberal dos anos 1990 e conduziu ao colapso de setembro do ano passado em escala global. Hegemonia, esta, da rápida circulação financeira, gestão de riscos, e todo esse conjunto de instrumentos de gestão financeira, que é permear o risco de investimento na área exploratória. A constituição é muito clara. Ela diz que os recursos do subsolo pertencem à nação, e o petróleo é monopólio da união. No entanto, a lei do governo Fernando Henrique não foi alterada até agora. O governo Lula diz que quando o petróleo sai de dentro do reservatório, passa a ser propriedade do concessionário. É uma metamorfose muito interessante criada no ano 1997 para privilegiar aquela visão de mundo que visava criar benefícios econômicos para certos grupos internacionais e nacionais. A proposta do programa de governo de Lula era mudar para partilha que visava apropriar em favor da sociedade uma fração maior do lucro na produção do petróleo. Este lucro deveria ir para investimentos sociais e ambientais, e isto não foi feito até agora. Os modelosAgora que já não existe mais risco exploratório nenhum, o governo está propondo o modelo de partilha, que me parece, embora seja um avanço em relação à posição anterior, muito tímido. Até porque a proposta que está colocada dá um enorme poder discricionário para um grupo de ministros de escolher o que fazer com o pré-sal que foi descoberto pela Petrobrás num esforço de mais de 50 anos de trabalho, com ênfase na última década, quando passou a investir. Mesmo com o modelo anterior, a Petrobras garantiu a autossuficiência e descobriu o pré-sal. Agora o governo está vogando a si o direito de arbitrar o que vai ser leiloado, para quem será leiloado, se para a Petrobras ou se para grupos privados. Escolheram na licitação quanto vão pagar ao governo pelo direito de explorar o pré-sal. A diferença é que a Petrobras está mantida com a principal operadora no projeto atual. Eu acho esse projeto tímido porque acho equivocado. O caminho normal para quem descobriu uma reserva de petróleo é dimensioná-la, saber quanto recurso há. Até hoje não se sabe nem se o pré-sal vai para Santa Catarina ou Espírito Santo, como tem falado, ou se ele vai até a Bahia ou Sergipe, como também é possível. De maneira que também não se sabe qual é o volume de petróleo, se um grande campo ou vários campos gigantes, cuja produção deve ser conjunta. Em minha opinião, o caminho mais correto para o país, que mais atenderia os interesses nacionais seria o seguinte: Primeiro, contrata-se a Petrobras para que ela conclua a exploração, isto é, a definição do volume de petróleo, onde ele está e quanto é, se nós temos a maior reserva do mundo, a segunda e a terceira reservas do mundo, ou se estamos no grupo intermediário. Dependendo do volume de petróleo que está lá, podemos fazer um plano nacional de desenvolvimento econômico social e ambiental. Definir quanto vai ser investido na alteração da matriz energética no investimento de fontes renováveis de energia, de maneira econômica. Segundo lugar: definir quais são as prioridades nacionais em investimentos de saúde nas próximas duas décadas, assim como na educação, no desenvolvimento científico e tecnológico, em investimentos para a mitigação e adaptação ambiental em função das mudanças climáticas e em infraestrutura. O país deveria recuperar sua capacidade de planejamento de definir que país nós queremos construir para as próximas décadas, ver quanto custa isso e depois determinar o ritmo de produção de petróleo somente para financiar essas coisas. O restante do petróleo poderia ficar embaixo da terra, porque há uma tendência de que ele se valorize mais ficando embaixo da terra do que o convertendo em dinheiro. Estamos tirando do seio da terra um produto que causa impactos ambientais, que terá maior valor no futuro, que é patrimônio das gerações futuras. Estamos queimando ele hoje para pagar contas correntes, não há estratégica para ser um plano nacional de desenvolvimento. Isto não está sendo feito. Está sendo acelerada a definição do modelo que permita a esse governo ainda no ano que vem, no meio do maior tumulto eleitoral, leiloar alguns blocos que provavelmente vão atender às demandas de grupos econômicos internacionais, que, por sua vez, têm vínculos diretos no processo eleitoral. Eu estou vendo com muita preocupação o que está se desenrolando no Congresso Nacional, neste momento. Acho que é um risco enorme de que o interesse nacional e o interesse do futuro da nação brasileira, mais uma vez, possa vir a ser mal utilizado em função de interesses e barganhas imediatas.
IHU On-Line – Você acredita que o Brasil ainda possa mudar para o modelo de partilha?
Ildo Sauer – Deve mudar, pois o governo tem um rolo compressor no Congresso e pode mudar. Eu não acho que o modelo de partilha seja o melhor. O modelo que eu defendo e que muitos movimentos sociais defendem é o seguinte: reestatizarmos o petróleo 100%, recompramos as ações da Petrobras, e ela opera o petróleo porque tem a melhor tecnologia do mundo para o pré-sal. Não precisa de outra petroleira do mundo aqui. Recursos financeiros não faltarão, pois quem está sentado em cima de reservas de petróleo terá o financiamento necessário para produzi-lo. O petróleo só deve ser produzido com eficiência pela Petrobras, na medida em que tivermos um projeto nacional de investimento em saúde, educação, proteção ambiental, melhoria da infraestrutura etc. Se tem isso não precisa de partilha. Se a Petrobras for 100% nacional, todo o lucro da produção do petróleo irá para um fundo constitucional para financiar estes projetos todos. Este é o melhor modelo, faltou coragem política ao governo, pois está vinculado a interesses de grandes grupos internacionais. Não é à toa que o Presidente da República, nesta terça-feira, em Nova York, foi recebido na Casa das Américas pela maior petroleira privada brasileira ao lado da maior petroleira privada mundial que é a Exxon e a Ogx. Está claramente indicado que o diálogo do governo com estes movimentos vincula seus compromissos de manter o status quo.
IHU On-Line – E como esse modelo muda a lógica da relação com o petróleo?
Ildo Sauer – Permite potencialmente e, dependendo dos resultados das licitações, uma fração, possivelmente, maior de dinheiro por interesse público. Só que este não é o melhor modelo. O modelo de partilha é melhor que o de concessão, mas o de prestação de serviços de uma empresa puramente estatal e de monopólio estatal do petróleo é melhor ainda. Hoje, 77% das reservas mundiais de petróleo estão na mão de empresas estatais, só 7% do petróleo estão na mão das chamadas grandes petroleiras, das chamadas sete irmãs, que, no século passado, partilharam o mundo, fizeram guerra, promoveram a miséria, derrubaram governos em nome dos lucros do petróleo. Hoje, é provável que elas não sobrevivam ao fim da era do petróleo. Acho que o Brasil tem um projeto bem melhor do que aquele que foi lançado no Congresso Nacional, que está em debate lá, e é extremamente preocupante a predominância do poder de influência dos grupos nacionais e internacionais. Há alguns dogmas, como a necessidade de ser privado, a necessidade de concorrência, de financiamentos, tecnologias, que são falácias porque não são verdadeiras na definição do modelo, e o que está por trás de tudo isso, em grande parte, são recursos para financiamento no processo eleitoral do ano que vem. Estão todos muitos sensíveis neste momento, em todos os espaços, e o povo brasileiro não está sabendo o que está se passando no Congresso. E no governo também, lamentavelmente, o quadro está se tornando muito preocupante.
IHU On-Line – E qual sua opinião sobre a criação da Petrosal?
Ildo Sauer – Não vejo necessidade da Petrosal. Ela é instrumento para montar o modelo que o governo está criando agora para compartilhar um pouco mais para o governo do dinheiro do petróleo e para que as multinacionais façam a administração disso. Se o governo tivesse coragem política, ele reestatizaria 100% da Petrobras, retomaria o monopólio total sobre o petróleo como todos os países do mundo fizeram. 77% do petróleo estão na mão de estados nacionais; e 100% de empresas estatais para desenvolvê-lo. Este é o modelo hegemônico. Se isso for feito, não precisa mais da Petrosal, da partilha, de nada. O mais simples seria reestatizar politicamente as reservas de petróleo, e colocar a Petrobras a serviço de desenvolvê-lo em um ritmo necessário para mudar o país e para criar um novo paradigma mundial na área ambiental, uma transição energética para fontes renováveis, sustentáveis para qual o Brasil também tenha hegemonia. Lamentavelmente, estamos mais uma vez sucumbindo à pressão dos interesses financeiros e econômicos internacionais de grupos nacionais. Fazemos um discurso pela esquerda e pelo popular, e uma prática para a direita em favor do grande capital, reproduzindo um modelo que tem levado a humanidade às crises constantes e à degradação ambiental.
IHU On-Line – Analisando a conjuntura atual, qual é o futuro do pré-sal, em sua opinião?
Ildo Sauer – Há dois futuros. Um dele é positivo, se a população brasileira se conscientizar e for capaz, tomando consciência do que está em jogo, de exigir do governo e do congresso um modelo adequado. Parece-me que o modelo do governo foi tímido, fraco e muda o discurso e a forma, mas não muda a essência. A essência que está em jogo com a relação de forças é que vai mais uma vez predominar no modelo de partilha, uma divisão que vai favorecer mais os grupos internacionais e dentro do país a acumulação de dinheiro para certos grupos, elites e projetos. Como a maioria do povo brasileiro, estou extremamente preocupado com o que está acontecendo, especialmente porque recentemente participei de alguns debates no congresso nacional e percebi que o ânimo lá é extremamente entreguista. Estão dispostos sobre o modelo de partilha a permitir ao manto da incerteza encobrir a entrega de grande parte do valor econômico e acelerar a produção do petróleo brasileiro sem necessidade. A melhor forma de fazer um projeto nacional seria definir as reservas, quantificá-las e somente extraí-las na medida do necessário para investir em educação, saúde, proteção ambiental, infraestrutura e mudança do Brasil. Isso porque o petróleo tende a valorizar mais debaixo da terra do que convertido em dinheiro neste momento. De maneira que essa questão estratégica não tem sido compreendida nem pelo governo nem pelo Congresso Nacional. A mobilização popular está muito fraca para permitir que a gente altere isso. É preciso um urgente esforço para não termos uma grande frustração no futuro.
IHU On-Line – A forma como o governo está conduzindo esta questão da exploração do petróleo na camada pré-sal pode influenciar nas eleições presidenciais do próximo ano?
Ildo Sauer – Veja, minha leitura é de que a agenda foi determinada eleitoralmente. O pré-sal já era conhecido desde 2006. O governo, mesmo assim, por duas vezes, tentou vender blocos em cima do pré-sal, só recuou diante da imensa pressão da Petrobras e de certos grupos de parlamentares e outras pessoas que contestaram a visão da Casa Civil sobre a condução do modelo. Levou um ano e meio para definir um plano de partilha que permite fazer qualquer coisa. O modelo de partilha que o governo propõe é o sonho de qualquer governo autoritário de direita que quer entregar tudo, porque permite escolher todos os blocos que serão leiloados sem responsabilização e sem transparência. É uma escolha de apenas alguns grupos que fazem parte do governo. Não me parece suficiente claro o que está acontecendo. Obviamente que isso está vinculado, como anunciou o ministro Lobão dia 24-09, na imprensa, aos leilões de blocos que serão feitos no ano que vem. Nesses leilões de blocos, se vinculará uma simpatia mútua em termos de apoiar o processo eleitoral com recursos para as campanhas. Isso é o que está mais claro no horizonte, para mim. Lamentavelmente, mais uma vez, estamos sacrificando a chance de administrar o país a longo prazo em nome da disputa imediata pelo poder para reproduzir esse sistema.